Levantamento revela falta de especialistas no atendimento à saúde mental dos policiais, agravando a situação

Um levantamento exclusivo do SBT Brasil, com base nos dados da Lei de Acesso à Informação, mostrou um cenário preocupante: nos últimos quatro anos, o número de policiais militares afastados por problemas de saúde mental no estado de São Paulo subiu quase 40%. Pressão constante, humilhações e negligência dos batalhões podem ser fatores que contribuem para essa alta.

Um policial militar, que preferiu não ser identificado, compartilhou sua experiência de 15 anos na corporação. Segundo ele, a depressão é tratada como “frescura” dentro da instituição:

“Hoje, a depressão dentro da instituição, sim, é frescura. ‘Ele não tem nada’, ‘ele está fingindo’.”

Esse tipo de reação piorou quando ele passou a ter sintomas mais graves:

“Comecei a perder meu sono noturno, perder o apetite e vinham pensamentos constantes de suicídio.”

Diante disso, ele precisou se afastar por quase um ano e meio para tratar a depressão. Porém, segundo ele, a perseguição dentro da corporação só piorou após o diagnóstico:

“Quando percebem que a pessoa tem esse tipo de problema, aí começa a perseguição, começa a piorar.”

Falta de atendimento especializado

O levantamento do SBT revelou que o número de PMs afastados por problemas de saúde mental subiu de 1.203 para 1.667 entre 2019 e 2023, um aumento de 38,5%. A Associação de Direitos Humanos dos Agentes de Segurança Pública alerta para a falta de especialistas no atendimento desses policiais. Marcos Manteiga, presidente da associação, critica a ausência de psiquiatras no Hospital da Polícia Militar:

“O médico da polícia militar precisa ser oficial da PM, mas não temos psiquiatra no hospital. Ele é atendido por oftalmologista, ginecologista, fazendo o papel de psiquiatra”.

Sem profissionais habilitados, os policiais enfrentam dificuldades para receber o tratamento adequado. Quando o soldado mencionado anteriormente expôs suas queixas, a resposta que recebeu foi ainda mais desmotivadora:

“Não adianta você ficar chorando, esse choro seu não me convence mais. Se não está contente, pede pra sair, vai embora.”

Pressão dentro da corporação

Para a doutora em psiquiatria pela USP, Alexandrina Meleiro, a cultura da corporação agrava o problema. Segundo ela, muitos policiais são obrigados a aparentar força, mesmo quando estão no limite:

“Dentro da própria corporação, criou-se uma dinâmica de que todo mundo tem que ser forte. Mas não é assim que se deve lidar com essas dificuldades.”

A rotina de um policial militar é marcada por situações de conflito, trabalho excessivo e baixa remuneração, fatores que prejudicam a saúde mental. Alexandrina destaca ainda que a exposição constante à violência sem apoio psicológico adequado agrava o quadro:

“Lidam direto com agressividade, risco de vida, violência severa. Sem uma válvula de escape, o adoecimento é inevitável.”

Por fim, o soldado afirma que depende de remédios fortes para conseguir dormir e aliviar os sintomas da depressão:

“Faço uso de remédios para dormir, antidepressivos.”

A falta de tratamento adequado pode levar o policial ao limite, como será detalhado na reportagem de amanhã. Segundo o depoimento final do soldado:

“Atrás daquela farda, existe um sentimento, uma cabeça, uma família. Ele chora, ele sangra, ele perde a vida. E não adianta.”

O que diz a Secretaria da Segurança Pública

A Polícia Militar tem ampliado as iniciativas já existentes de suporte ao bem-estar e atendimento psicológico aos policiais militares da ativa por meio do seu Sistema de Saúde Mental (SISMen), que disponibiliza atendimento psicossocial no Centro de Atenção Psicológica e Social (CAPS), na capital, e também em 41 Núcleos de Atenção Psicossocial em todas as regiões do estado. Além disso, há o serviço de telepsicologia, com atendimento psicoemocional de policiais da ativa ou da reserva com agendamento e consultas online.

A Corporação também fornece suporte psicológico a todos os policiais envolvidos em casos de maior gravidade, como confrontos armados. Os PMs envolvidos nessas ocorrências passam por avaliação com psicólogos em, no mínimo, dois momentos para o devido monitoramento. O tempo de afastamento é determinado de acordo com cada caso, atendendo às necessidades individuais de cada paciente.

Somada a essas iniciativas, a SSP realiza periodicamente seminários, palestras e aulas, e disponibiliza cartilhas nas academias que buscam levar aos profissionais informações de caráter preventivo. Especificamente na PM, cartilhas de prevenção são disponibilizadas ao efetivo e estão disponíveis na página do Centro de Atenção Psicológica e Social (CAPS), na intranet da Instituição. Desta forma, o acesso é livre e fácil, podendo ser consultado por todos os policiais a qualquer momento. Além da cartilha, o Sistema de Saúde Mental (SISMen) conta com diversas outras iniciativas voltadas ao acolhimento e orientação dos militares para prevenir e combater suicídios. Essas medidas são continuamente realizadas e aperfeiçoadas pela instituição, a fim de garantir a saúde mental e o bem-estar dos policiais.