A comunidade acadêmica da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), unidade Frutal, no Triângulo Mineiro, quer a conclusão das obras da extinta Hidroex, a Fundação Centro Educação, Capacitação e Pesquisa Aplicada em Águas, também conhecida como Cidade das Águas. Alunos, professores e funcionários, assim como moradores e lideranças políticas e comunitárias, reivindicam, também, a transferência, para a universidade, da escritura pública da fundação e dos terrenos onde foi instalada.
As demandas foram defendidas durante audiência da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nessa sexta-feira (30/8/19), no anfiteatro do campus universitário local. Solicitada pelo deputado Raul Belém (PSC), a audiência teve por objetivo discutir o abandono do patrimônio móvel e imóvel da Hidroex, criada em 2009 e extinta em 2016, pela Lei 22.291, após denúncias de irregularidades e desvio de recursos públicos.
A mesma lei destinou à Uemg os bens móveis da instituição extinta, mas, por força legal, os terrenos pertencem à Secretaria de Estado de Fazenda. Além disso, a universidade não consegue usufruir dessa herança de forma plena, já que não há infraestrutura nem instalações em condições de receber equipamentos de laboratórios, mobiliário e itens de informática e implementos agrícolas, por exemplo.
Isso porque, dos 40 prédios que fariam parte do complexo da Hidroex, de acordo com o projeto, muitos não foram concluídos, outros sequer saíram do papel. E a Uemg herdou apenas quatro, mesmo assim, não pode utilizá-los porque eles não estão dotados de sistema de energia elétrica capaz de colocar em funcionamento os equipamentos, que permanecem guardados em caixa, alguns se estragando por falta de uso.
Transporte e segurança – A Uemg herdou também, da Hidroex, veículos como ônibus e vans, que poderiam ser utilizados no transporte escolar, mas estão parados, pois a maioria, ao ser entregue à universidade, já necessitava de manutenção e a Uemg não dispõe de recursos para recuperá-los.
A segurança no campus é outro ponto que preocupa a comunidade. No local, são constantes os roubos e furtos, apesar do reforço oferecido pela Polícia Militar. Para fazer o cercamento do terreno, são necessários recursos da ordem de R$ 700 mil reais, já licitados, mas ainda não repassados pelo governo do Estado.
“É um patrimônio que poderia ter utilidade para a população e para a universidade, que tem toda condição de assumir esse projeto, desde que o Governo do Estado possa ajudar na conclusão e aumentar o orçamento da universidade, hoje extremamente reduzido”, observou o deputado Raul Belém, que propôs discutir o assunto com os governos estadual e federal. “Meu objetivo é contribuir”, disse o parlamentar, propondo-se a agir como interlocutor da Assembleia de Minas.
Diretor defende lei orçamentária para as universidades estaduais
O diretor da Uemg Frutal, professor Alynsson Takehiro Fujita, afirma que a instituição tem alunos, professores e pesquisadores competentes, em condições de executar importantes projetos de pesquisa sobre águas e meio ambiente. “Não se pode tratar recursos hídricos de forma isolada, mas em articulação com os recursos naturais e humanos”, ressaltou.
Contudo, lamentou a falta de recursos financeiros que permitam à Uemg levar adiante seus projetos. Por isso, defende a elaboração de uma lei orçamentária para as universidades estaduais de forma que as instituições possam prever ações acadêmicas com planejamento.
“Não precisamos rever a Hidroex, precisamos de uma universidade que se consolide em sua proposta de ensino, pesquisa e extensão”, afirmou. Para ele, “falta decisão política”.
O diretor considera “um erro empurrar goela abaixo da instituição” o passivo deixado pela Hidroex, sem discussão com a comunidade. Ele explica que a universidade construiu coletivamente um plano diretor que precisa ser considerado na decisão final.
A Uemg Frutal conta com 1200 alunos, 69 professores e pesquisadores, além dos funcionários técnico-administrativos. A unidade dispõe de sete cursos de graduação, dois mestrados e outros de especialização.
Grupo de trabalho prepara diagnóstico para levar ao governo federal
Na mesma linha, o pró-reitor de Planejamento, Fernando Sette Júnior, defendeu o comprometimento dos governos do Estado e da União para a dotação de recursos, de forma que a universidade possa assumir o passivo, mas com apoio financeiro, já que as verbas da instituição são muito limitadas.
Ele explicou que no último dia 29 foi criado um grupo de trabalho, que já vinha sendo gestado há poucos meses, envolvendo todos os órgãos e entidades que, de alguma forma, estão relacionados com o projeto da Hidroex. Isso inclui, além da Uemg, várias secretarias de Estado, como a de Fazenda e a de Infraestrutura, a Fapemig, empresa de pesquisa do Estado, e o governo federal.
Este grupo de trabalho vai fazer um levantamento e, após 60 dias, vai apresentar um relatório com um diagnóstico geral e algumas propostas a serem levadas para discussão com o governo federal. Nesse trabalho será aproveitado também o relatório feito pela própria Uemg e já concluído.
O projeto – A Hidroex foi projetada para ser uma grande instituição de referência em pesquisa de recursos hídricos, com a participação de universidades nacionais e internacionais, mais de 40 prédios, entre eles uma biblioteca de mais de 3,9 mil metros quadrados, alojamentos, laboratórios, uma vila olímpica e outras instalações.
A obra foi iniciada durante a gestão do ex-secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais, Nárcio Rodrigues, entre 2012 e 2014, mas, em 2016, devido a diversas denúncias de irregularidades e desvio de verbas, o projeto foi extinto.
Promotora aponta fraudes e outras irregularidades
Na audiência desta sexta-feira (30), as denúncias foram várias vezes mencionadas, inclusive pela promotora de Justiça do Patrimônio Público do Idoso e Deficiente da Comarca de Frutal, Daniela Campos de Abreu Serra. Segundo ela, o projeto, grandioso, prometia a construção de 576 vagas de alojamentos, biblioteca e laboratórios, a um custo de R$ 250 milhões.
“Já se gastaram R$ 157 milhões e as obras foram paralisadas”, criticou, afirmando ainda que mais de 53% das obras foram de “execução irregular”. Ela apontou “fraudes e pagamentos de propina até na Europa” e disse que os recursos foram “para financiar eleições”.
Presente à reunião, o ex-deputado federal Caio Nárcio, filho do ex-secretário Nárcio Rodrigues, defendeu a continuidade do projeto, apesar de a Hidroex ter sido legalmente extinta. “Pra mim, a Hidroex é uma grande oportunidade de crescimento para a universidade. É uma pena assistir o descaso com que essa universidade está sendo tratada e o abandono do projeto. Me vi no dever de vir aqui hoje e colocar a minha opinião”, disse, enfrentando as críticas do auditório.
Assembleia Legislativa de Minas Gerais