Somente entre janeiro e setembro deste ano, já foram registrados 2270 estupros consumados de vulnerável em Minas Gerais, segundo dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Estado. Isso significa que, a cada dia, oito crianças ou adolescentes de até 14 anos são vítimas de crimes sexuais em solo mineiro. Em Belo Horizonte, que contabiliza o maior número de casos no Estado, já são 265 registros em 2019.

As consequência de um abuso sexual na infância são inevitáveis. É possível, no entanto, trabalhar este trauma por meio de acompanhamento psicossocial. A psicóloga que realiza as escutas qualificadas na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), em Belo Horizonte, Jaqueline de Araújo, explica que crianças muito pequenas que sofrem abusos costumam ter menos traumas ao longo da vida, enquanto crianças a partir dos 7 ou 8 anos acabam tendo um prejuízo psicológico muito maior na adolescência.

“Vemos casos de distúrbios alimentares, tentativas de suicídio, automutilação, depressão. Quanto mais tarde a criança relata o abuso, mais marcas ficam nela ao longo da vida. É importante colocar isso para fora, porque é desta forma que começa o processo de cura.  Eu atendi uma adolescente, uma vez, que se cortava como um meio de aliviar, momentaneamente, a angústia causada pela dor que estava dentro dela”, detalha.

A professora de Psicologia do Desenvolvimento das Faculdades Promove Luciana Moreira lembra que uma criança ou mesmo adolescente não possui as mesmas defesas de um adulto para lidar com o trauma, por isso o acompanhamento psicológico das vítimas de abuso é essencial.

“É uma situação traumática e a criança não tem recursos para lidar com essa realidade. Ela pode sentir até mesmo culpa. Com isso, acabam restando sequelas pelo resto da vida, como inibição no campo intelectual, dificuldade de aprendizagem, quadro de ansiedade, insônia”, completa.

A delegada Renata Fagundes, da Depca, explicou que, mais importante do que punir os autores dos crimes, a prevenção para que os abusos sexuais não aconteça é essencial. E falar sobre sexualidade com crianças é um destes mecanismos de defesa.

Como ter acesso ao atendimento psicológico gratuito em BH 

A Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte informou que os próprios centros de saúde da cidade contam com uma equipe de saúde mental capacitada a atender e encaminhar os casos, de acordo com o diagnóstico. Além disso, há três Centros de Referência em Saúde Mental Infantil, localizados nas regionais Nordeste, Noroeste e Centro-Sul.

“Essas unidades são porta aberta (não exigem encaminhamento) e também recebem pacientes encaminhados pelos outros serviços. A unidade Nordeste atende também os pacientes das regionais Norte e Venda Nova. A unidade Noroeste, atende Oeste e Pampulha e a unidade Centro-Sul é referência também para Leste e Barreiro”, esclarece o órgão, por meio de nota.

Há ainda o Cavas, oriundo de um projeto de pesquisa e extensão da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que fornece atendimento psicológico gratuito e com frequência semanal a crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Basta que o caso atenda a alguns pré-requisitos como ter sido feita a denúncia à polícia. Para solicitar o atendimento é preciso preencher ao formulário, clicando aqui. Mais informações sobre o projeto podem ser obtidas neste link.

Punição 

Vale lembrar que, em caso de negligência, por exemplo, quando o responsável pela criança vê ou tem ciência do crime, e não faz nada, ele responde pelo mesmo crime, o de estupro de vulnerável, que prevê pena de oito a 15 anos de reclusão, podendo chegar a 30 se houver a morte da criança. Esta tipificação vale para menores de 14 anos. A partir desta idade, quando o agressor oferece algo em troca da relação sexual com o menor, o crime previsto é o de exploração sexual, mesmo se houver consentimento do adolescente.

“Exploração sexual é o estupro de adolescentes de 14 a 18 anos, que não são considerados mais vulneráveis pela da lei caso aja consentimento. No entanto, mesmo se houver um suposto consentimento, mas se é oferecido algum benefício para este adolescente em troca da relação sexual, como dinheiro, moradia ou comida, é considerado crime”, explica a delegada da Depca, Renata Fagundes. A pena para o crime de exploração sexual é de quatro a 10 anos de prisão.

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