De acupuntura a yoga, atividades disponíveis no SUS auxiliam desde o tratamento de dores crônicas ao de ansiedade e depressão

“Essas atividades me ajudaram muito a lidar com um momento difícil da minha vida. Participo desde antes da pandemia. Eu vinha com uma questão de doença da minha mãe. Comecei a fazer exercícios, interagir com o pessoal e isso foi muito bom para mim. A equipe é muito boa”, relata Júnia dos Santos Correa, que chega antes das 8h na Praça Catumbi, em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), para praticar exercícios físicos e Tai Chi Chuan. Na praça, também são realizadas atividades de fisioterapia e meditação por profissionais da Secretaria Municipal de Saúde.

“Fiquei sabendo pelo posto de saúde e passei a frequentar há cinco meses. Essa forma de tratamento, incentivando cada um, vem sendo boa não só para mim, mas para todos que estão aqui”, descreve Ronei Allan de Oliveira, que também participa das atividades na Praça Catumbi. Ele aponta ainda o movimento de socialização que as atividades promovem. “Ficamos isolados durante a pandemia e ser recebido como família por todos é muito bom”.

As atividades que Julia e Ronei frequentam estão na lista das 29 Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (Pics) oferecidas de forma integral e gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o estado.  Reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como parte da Medicina Tradicional e Complementar (MTC), as práticas têm se fortalecido como um caminho complementar para a recuperação e promoção da saúde. Os atendimentos começam na Atenção Básica, principal porta de entrada para o SUS, mas podem estar presentes em todos os pontos da Rede de Atenção à Saúde.

De acordo com a referência técnica da Coordenação de Práticas Integrativas e Complementares da Secretaria de Estado de Minas Gerais (SES-MG), Paula Souza Oliveira, o estado foi precursor na criação da Política Estadual de Práticas Integrativas e Complementares, em 2009, e, embora haja semelhanças com a Política Nacional, criada em 2006, Minas buscou refletir as peculiaridades do seu território, orientando as Secretarias Municipais de Saúde sobre como implantar as práticas no âmbito local.

As Pics atuam de forma complementar aos tratamentos convencionais e contribuem para uma visão ampliada do processo saúde/doença e da promoção do cuidado integral, além de proporcionarem autonomia dos sujeitos, empoderamento do usuário e valorização do saber popular. Acupuntura, aromaterapia, auriculoterapia, biodança, cromoterapia, massoterapia e reiki são algumas das terapias que estão entre as Pics.

“As Pics se aplicam, por exemplo, na saúde mental, por conta de insônia, depressão, ansiedade e transtornos de pânico e quando pensamos em pacientes com dores crônicas, como mialgias, lombalgias e artrites. Então é importante também essa abordagem no âmbito da atenção especializada”, comenta a referência técnica.

Paula Souza reitera que esses tratamentos são oferecidos de forma gratuita em todas as esferas da saúde pública no estado. “Todos os procedimentos possuem um caráter transversal, ou seja, estão presentes em todos os equipamentos de saúde, desde a Unidade Básica (UBS), no âmbito da Atenção Primária, passando por serviços como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que são da Atenção Especializada, até chegar ao âmbito da Atenção Hospitalar “, explica.

A lista dos municípios e práticas ofertadas por cada um deles está disponível no site da SES-MG e pode ser acessada em www.saude.mg.gov.br/pics.

Leandro Heringer

Práticas, espaços públicos e vínculo com a comunidade

Trabalhando com as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde desde março de 2023 em Santa Luzia, a fisioterapeuta especialista em ortopedia e fisioterapia cardiorrespiratória da equipe eMulti do município, Joyce Castro Coelho Batista, destaca a integração com a comunidade como um dos benefícios notáveis das práticas. “É perceptível a maior interação entre profissionais e comunidade na apropriação do espaço público. A melhora no bem-estar e saúde dos participantes proporciona, inclusive, menor demanda de atendimento médico nos postos”, salienta.

A Praça Catumbi, por exemplo, é definida pela fisioterapeuta como local de encontro e formação de vínculos entre os participantes e profissionais em que tanto a saúde física quanto mental são trabalhadas. “Temos um espaço para promover saúde. Vemos, claramente, a melhora da mobilidade física, coordenação motora, diminuição dos quadros ansiosos e depressivos, melhora da dor crônica e sequelas de chikungunya”, conta a profissional.

A ginástica terapêutica Lian Gong em 18 Terapias (LG18T) é uma prática corporal fundamentada na Medicina Tradicional Chinesa, desenvolvida especialmente para prevenir e tratar dores crônicas, trabalhar a mente e as emoções e pode ser praticada por usuários das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) da capital mineira. “As atividades ocorrem nas unidades de saúde e em seu entorno, como quadras, praças e parques, além de outros equipamentos públicos como Centros de Convivência, Centros Culturais, Centros Esportivos, Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e salões de associações ou de igrejas”, explica a coordenadora Luzia Hanashiro.

“Um dos objetivos da LG18T é modificar o paradigma assistencialista hegemônico com ênfase na doença para o paradigma da promoção da saúde e prevenção das doenças estimulando o autocuidado e transformando o cidadão no responsável por sua própria saúde”, complementa a também coordenadora da prática em Belo Horizonte, Vânia Duarte. Com equipe multidisciplinar envolvida, profissionais de saúde lotados nas UBS são capacitados como instrutores de LG18T para conduzir a atividade pelo menos duas vezes por semana, por um período de 40 a 60 minutos.

As Pics também ocorrem nos consultórios. A percepção de prática complementar é exercida pela médica e estudante das práticas de homeopatia e medicina antroposófica da UBS de Bom Jesus, Natália Fernandes, no município de Matozinhos. “Faço a auriculoacupuntura no próprio atendimento, de acordo com o diagnóstico. Uso para casos de ansiedade antes de receitar medicamentos. O conhecimento da medicina antroposófica e da homeopatia enriquecem o atendimento”, explica.

A médica exemplifica o resultado da prática da auriculoterapia no dia a dia. “Um paciente chegou com soluços que já duravam dois dias. Após a auriculoterapia, os soluços passaram e ele ficou bem impressionado”, conta. Sobre a medicina antroposófica, ela cita um caso referente à saúde mental. “Era possível o diagnóstico de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), mas, com a medicina antroposófica, a paciente conseguiu excelentes resultados”, afirma.

Atuação da SES-MG

A SES-MG é responsável por estimular, coordenar, monitorar e fortalecer as Pics junto aos municípios. Desde fevereiro de 2023, por meio de deliberação na Comissão Intergestores Bipartite do Estado de Minas Gerais (CIB-SUS/MG), foi definida a distribuição semestral de insumos utilizados na acupuntura e na auriculoterapia, como agulhas e sementes de mostarda.

A distribuição teve início em abril e mais de 200 municípios mineiros já foram comtemplados. Fazem jus aos materiais aqueles que já possuem as práticas de auriculoterapia ou acupuntura implantadas e registradas nos sistemas oficiais de saúde da Atenção Primária, no semestre correspondente ao exercício anterior.

Em outubro de 2022, a SES-MG também destinou incentivo financeiro excepcional para apoiar atividades de práticas integrativas e complementares em saúde na Atenção Primária. Os municípios mineiros que registraram ações em 2021, no âmbito da política, de acordo com o porte, receberam, de R$ 60 mil a R$ 200 mil reais para a compra de insumos, capacitação e qualificação de profissionais e ações de educação.

De acordo com o Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (Sisab), em 2022, foram realizados 127.582 procedimentos de Pics em Minas Gerais, dos quais 122.704 foram atividades individuais e 16.347, atividades coletivas.

Naquele ano, 656 dos 853 municípios mineiros ofertaram Pics em todos os níveis de atenção (77%), sendo que 625 oferecem as práticas na Atenção Primária, o que corresponde a 73%.

Agência Minas