Aos 17 anos, o jovem L. F. R (nome preservado), já envolvido com o tráfico de drogas, foi detido por tentativa de homicídio e condenado à internação no Centro Socioeducativo Justinópolis, em Ribeirão das Neves, onde ficou por dez meses. “Durante o tempo que fiquei internado mudei muito a minha visão de vida, saí mais amadurecido e com vontade de mudar o meu futuro”, conta. Hoje com 19 anos, o jovem cursa Manutenção Mecânica Industrial no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e faz planos para uma carreira na área.
Em busca de cada vez mais exemplos como este, em Minas Gerais a Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (Suase), vinculada à Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp), trabalha para a humanização das políticas de atendimento ao adolescente autor de ato infracional. Hoje, 1.330 adolescentes cumprem medida socioeducativa de internação no estado, 200 estão em semiliberdade e outros 198 em internação provisória.
Desde a substituição da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) pelas pastas de Segurança Pública (Sesp) e Administração Prisional (Seap), realizada como parte das mudanças da Reforma Administrativa, a concepção do atendimento aos meninos e meninas entre 12 e 17 anos no Estado tem sido transformada, dando lugar a um modelo mais humanizado e focado na prevenção.
“Quando o jovem vai cumprir medida socioeducativa, ele precisa ser ressocializado de forma efetiva, isto é, precisa ser conduzido a uma nova linguagem de vida. Se eu não consigo melhorar e garantir cidadania para estes adolescentes que cometeram atos infracionais, mais tarde eles irão para o sistema prisional, então o sistema socioeducativo acaba sendo porta de entrada”, afirma o subsecretário de Atendimento Socioeducativo da Sesp, Danilo Salas.
O trabalho com o adolescente ocorre por meio do cumprimento de medidas socioeducativas e objetiva proporcionar atendimento integral ao jovem, dando a ele a oportunidade de vivenciar diversas experiências profissionalizantes, escolares, culturais, esportivas e artísticas.
Como parte da mudança de posicionamento do Governo de Minas Gerais no que tange à ênfase em políticas preventivas foi criada a Subsecretaria de Políticas de Prevenção à Criminalidade. “Antes o assunto era tratado apenas em uma coordenação. Agora, a ideia é que tenhamos estratégias especificamente pensadas para prevenir que este jovem atendido pelo sistema vire um reincidente”, diz Salas.
Outro passo importante é que, desde dezembro, a Suase encabeça a coordenação do Fórum Permanente do Sistema de Atendimento Socioeducativo, que trabalha pela promoção e defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes. O Fórum estimula uma atuação conjunta entre as instituições envolvidas no atendimento ao adolescente em conflito com a lei penal, além de representantes de instituições públicas e da sociedade civil.
“Em conjunto, fomentaremos ações de atendimento ao adolescente em conflito com a lei, impulsionando esses debates também para o interior do estado”, diz Salas, que é agora o coordenador geral do Fórum.
Como parte das estratégias o Governo do Estado criou, ainda, o Grupo de Trabalho para o Atendimento ao Adolescente, para conduzir as mudanças. Coordenado pela Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) e composto por diversos atores, como Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social (Sedese), Sesp e outros, o grupo realiza reuniões periódicas e tem caráter propositivo.
Novo currículo escolar
Em parceria com a Secretaria de Estado de Educação (SEE), a Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) mantém em todas as unidades de internação uma escola formal e regular. Este ano, dentro do viés de prevenção à criminalidade, foram definidas novas diretrizes pedagógicas para as 17 escolas do Sistema Socioeducativo do Estado. No último dia 4 de janeiro as diretrizes foram apresentadas aos diretores das escolas, diretores das unidades socioeducativas e inspetores das Superintendências Regionais de Ensino (SREs).
“O novo currículo leva em consideração que os adolescentes atendidos não possuem vínculos com a escola: encontram-se evadidos, não matriculados ou, mesmo quando matriculados, estão infrequentes. Assim, temos grande número de jovens com distorção idade/ano de escolaridade e que apresentam dificuldades de aprendizagem”, explica a superintendente de Desenvolvimento do Ensino Médio da SEE, Cecília Resende. Após sua entrada para o sistema, mais de 90% deles passam a frequentar no mínimo 75% das aulas.
A principal novidade, porém, é a oferta de uma proposta pedagógica específica para a internação provisória (não superior a 45 dias), que consistirá em desenvolver habilidades por meio de oficinas de Língua Portuguesa e Matemática. Os professores serão contratados em modelo de regente de turmas, com carga horária de 20 horas semanais, e exercerão a função de mediadores de aprendizagem no desenvolvimento das oficinas.
Dentro dos centros socioeducativos, além de estudarem em escola regular e formal, os adolescentes também participam de cursos profissionalizantes, todos com certificado ao final. O número de jovens entre 14 a 17 anos que concluíram o ensino profissionalizante em 2016 dentro das unidades socioeducativas foi 73% superior ao ano de 2014.
O jovem L. F. R (nome preservado), por exemplo, desligado do sistema socioeducativo há pouco mais de um ano, realizou dois cursos profissionalizantes durante sua internação, e, ao ser liberado, conseguiu emprego em uma empresa de ônibus. “Vi que poderia crescer na empresa se buscasse mais cursos”, relata. Ele então procurou o Se Liga, programa da Sesp que oferece apoio aos egressos do sistema socioeducativo.
O Se Liga é um programa de livre adesão, que faz a mediação entre o egresso e a rede parceira da Suase, promovendo o encaminhamento para cursos profissionalizantes, escolas, serviços de saúde pública, espaços culturais, áreas de lazer, entre outros. Foi com auxílio do programa que L. F. R conseguiu o acesso ao curso do Senai, que tem duração de um ano e meio. “Quando você é privado da sua liberdade, você repensa muita coisa. Os meses que passei internado me fizeram voltar a querer crescer profissionalmente”, completa.
Destaque no Enem
Em 2016, Minas Gerais foi o estado com o maior número de jovens cumprindo medida socioeducativa inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio para Pessoas Privadas de Liberdade (Enem PPL), proporcionalmente ao número de internos. Fizeram a prova 497 adolescentes, o que representa um quarto da população socioeducativa do estado, segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
Quando se leva em consideração os jovens aptos para o exame, seja para entrada no ensino superior ou certificação no ensino médio, esse percentual chegou a 88% do total de adolescentes sob a tutela da Suase.
Além da liderança no ranking nacional, Minas Gerais também contabilizou um aumento de 46% no número de inscritos, em relação a 2015, quando 340 adolescentes participaram da prova. Comparado a 2014, o aumento ultrapassa os 140%. “Este resultado ratifica o esforço do Governo mineiro em implementar uma política que interrompa a trajetória infracional e dê condições não apenas de educação, mas também de cidadania”, conclui o subsecretário de Atendimento Socioeducativo, Danilo Salas.
Sedese atua no meio aberto
A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) também tem papel no sistema socioeducativo, e atua na modalidade chamada de meio aberto (Prestação de Serviço a Comunidade e Liberdade Assistida). As medidas de meio aberto são executadas pelos municípios nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas), cabendo ao Estado, por meio da Sedese, a assessoria técnica e suplementação financeira aos municípios para a oferta regular deste serviço.
“Neste sentido, a atuação da Sedese é de qualificação das ofertas municipais do serviço em meio aberto, contribuindo para o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários dos adolescentes, redução da reincidência, do ciclo da violência e da prática do ato infracional”, explica o diretor de Proteção Social Especial da Sedese, Regis Spíndola.
Segundo dados do Censo Suas 2015, no ano passado foram 13.468 adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto em Minas Gerais, em 219 Creas, localizados em 208 municípios. “Existe, hoje, um maior investimento do Governo do Estado neste meio aberto, isto é, quando o adolescente ainda não cometeu atos graves, o que certamente traz um impacto positivo na redução de adolescentes futuramente privados de liberdade”, ressalta.
Antes da reforma administrativa, as ações estaduais de apoio e fomento ao meio aberto se concentravam em 22 municípios (conveniados com a antiga Seds). Na incorporação pela Sedese, o número é superior a 200, seguindo regras da política de assistência social.
Agência Minas