Relatório divulgado nesta quinta-feira, 12, pela organização não governamental Human Rights Watch (HRW) critica a superlotação dos presídios brasileiros e diz que falhas na legislação antidrogas levam a esse quadro. A entidade também condena a não separação de detentos por tipo de crime e por ligação com facções criminosas nas cadeias do país.
As recentes chacinas em presídios no Amazonas e em Roraima, que mataram cerca de 100 presos no começo de janeiro, não são abordadas no relatório deste ano.
A diretora da HRW no Brasil, Maria Laura Canineu, disse que a Lei de Drogas em vigor no país, de 2006, é uma das responsáveis pela superlotação nos presídios. “Porque essa lei aumentou as penas para o tráfico e, embora tenha determinado penas alternativas, como trabalhos comunitários para o usuário, a lei deixou muita vaga a interpretação, e um pouco na mão das autoridades policiais a interpretação de quem é usuário e quem é traficante”, criticou.
Segundo Maria Laura, muitas pessoas são presas por portar quantidades pequenas de drogas e acabam sendo tratadas como traficantes e encarceradas ao lado de condenados por crimes graves, como latrocínio, homicídio, entre outros. Para a ativista, a política de combate às drogas no país deve ser revista levando em conta a situação prisional, uma vez que cerca de 60% da população carcerária masculina está nas cadeias por crimes relacionados a drogas. Entre as mulheres, o percentual é de quase 30%. “É um número relevante no sistema para ser ignorado”, ponderou.
Também em relação ao sistema prisional, a Human Rights Watch aponta no relatório a necessidade de separação entre presos provisórios – que ainda aguardam julgamento – e os que já foram condenados. Além disso, a entidade também defende a divisão dos detentos por periculosidade e por envolvimento com facções, para evitar que grupos rivais entrem em conflito como o que levou à recente chacina em Manaus.
Na prática, segundo Maria Laura Canineu, colocar um detento de uma facção em um presídio dominado por outra funciona como “uma sentença de morte”.
Além do sistema carcerário, o relatório também lista problemas do modelo socioeducativo, que recebe adolescentes envolvidos em atos infracionais. Na avaliação da diretora da ONG, por causa das falhas da ressocialização, o sistema socioeducativo acaba servindo como “um recrutamento para o crime”. Além disso, segundo Maria Laura, a discussão sobre a redução da maioridade penal é “absolutamente negativa” para a recuperação desses jovens e só deve piorar a situação.
Mortes pela polícia
A ONG também cita entre as violações de direitos humanos no Brasil o alto número de assassinatos cometidos por policiais. A Human Rights Watch diz que é preciso investigar e punir os culpados pelas execuções extrajudiciais para proteger os cidadãos e a própria polícia.
“Quando o policial executa um criminoso, um suspeito de ser criminoso, que sabe que a polícia vai matar ou torturar barbaramente, ele não vai se entregar pacificamente e, na primeira oportunidade, vai matar o policial, seja dentro ou fora do serviço”, disse Maria Laura, que ponderou que o número de policiais mortos no país também é “absurdo”.
Em 2015, foram 393 policiais assassinados no Brasil, de acordo com Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No mesmo ano, as polícias mataram 3.345 pessoas, o que representa um crescimento de 6% em comparação a 2014 e 52% em relação a 2013. No Rio de Janeiro, as mortes por intervenção policial subiram 30% de 2015 para 2016. Não há, porém, como distinguir quantas dessas mortes foram por confronto ou são execuções, segundo a diretora da Human Rights Watch.
Avanços
Apesar das críticas, o Relatório Mundial da Human Rights Watch também reconhece avanços na garantia de direitos humanos no Brasil, entre eles a expansão para todas as capitais do programa de audiências de custódia, conduzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que dá aos presos o direito de ser levado a uma autoridade judicial imediatamente após a prisão em fragrante.
Outro ponto positivo citado pela ONG é a consolidação do mecanismo de combate à tortura, no âmbito do Ministério da Justiça.
Agência Brasil